Tenho pena dos homens que perderam suas tardes. Tenho pena de mim, que sou pobre de tardes, tentando salvar algumas delas das salas fechadas em que trabalho. Quero-as de volta, uma a uma, para com elas aprender as eternas lições do tempo.
Aprendo com a tarde que o mais longo dos dias entregará sua luz à penumbra. Não adianta, nem vale a pena, querer retardar o passar do tempo. Inútil negar a lenta invasão das sombras com as luzes atemporais dos shoppings e escritórios. A tarde sempre cairá.
Por mais árduo que seja o dia, a tarde sempre nos espera com uma promessa de descanso. Pagamos um preço alto por não atender a este chamado. Nos lugares em que ainda existem árvores, vemos o recolher das aves assim que o sol começa o seu declínio. Os únicos bichos que não voltam de tarde para casa somos nós, que trocamos o tempo por dinheiro. E vendemos a tarde por tão pouco.
Ainda existem lugares em que as pessoas levam suas cadeiras para a calçada e ficam esperando a tarde findar. Ficam ali, incrustadas no tempo, passando com o tempo, sem resistir a ele. Sabem que dali a pouco será noite e a noite será bem-vinda, pois marcará o fim de mais um ciclo de luz e sombra. O fim é sombra.
Talvez seja o medo do escuro que nos faça melancólicos ao fim da tarde. Talvez seja o medo da morte que nos faz sentir medo da noite. Talvez seja a incerteza de que depois da noite volte a amanhecer. Temos medo de ser despejados do ciclo das noites e dos dias.
A tarde existe para nos ensinar a deslizar entre o claro e o escuro. É a mestra que nos prepara pacientemente para pisar o terreno estrangeiro do sono e por lá encontrar o que temos de mais íntimo e estranho.
A tarde me ensina a arte do silêncio e da espera. E, mais que isto, me ensina a lição da entrega ao escuro que carrego dentro de mim.
Foto: Ana Patrícia
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