21 junho 2014

Sentadinho

        

         A coisa toda tinha um ar meio decadente. Eu tinha me esquecido de pagar uma taxa de condomínio que, implacavelmente, foi enviada para cobrança em cartório. No próprio documento de cobrança o cartório já avisava que a parte do credor tinha que ser paga através de cheque visado ou cheque administrativo. Pensei que se tratava de alguma informação caduca que o cartório tinha esquecido de atualizar.  Estava redondamente enganado.  Meus cartões de crédito eram inúteis para enfrentar a exigência burocrática. Dinheiro vivo também não adiantava. Era cheque, ou nada.
         Não sei quem ainda se lembra do que seja um cheque visado. Para obtê-lo, você tem que ir na agência bancária onde tem conta e pagar para que eles te entreguem um cheque todo enfeitado de assinaturas e carimbos, em nome do credor, com o valor já debitado em sua conta. Uma chateação que iria me levar pelo menos o que me restava da manhã e um pedaço da tarde. A outra opção, a do cheque administrativo, se tornou mais atraente. Bastava atravessar a rua, ir numa agência do banco que podia não ser a minha, e comprar um cheque no valor devido.
         Dei sorte, pois a agência estava quase vazia e ainda por cima me deram uma senha preferencial. Eis uma das poucas vantagens de ter ultrapassado a linha vermelha dos sessenta. E foi exatamente essa aparência de avô desamparado que levou a moça do caixa a me falar em um tom afetadamente carinhoso: olhe, vai demorar um pouco, fique ali esperando sentadinho...

         Agradeci a gentileza da moça, mas dispensei o sentadinho. Eu poderia esperar em pé quantas horas fossem preciso, poderia até me sentar um pouco de vez em quando, mas sentadinho, não. Ficar sentadinho significa ir para um canto e lá permanecer quietinho, caladinho, sem causar nenhum incômodo adicional à sua presença decrépita. E quem me conhece sabe que esta é a última coisa que se deve esperar de mim. 

Imagem obtida em www.wikirio.com.br