12 julho 2011

Benefícios de uma pequena tragédia

Desde que mandei fazer novas estantes, há mais ou menos um ano, venho adiando a arrumação dos meus livros. Tinha uma vaga idéia onde eles estavam. Separei mais ou menos por assunto nas prateleiras, deixei ao alcance da mão os mais requisitados e fui tocando, movido pela preguiça e pela possibilidade de uma reforma que acabou adiada sine die.

Daí, aconteceu uma tragédia. O excesso de chuva encharcou uma parede e, quando dei por mim, o mofo estava definitivamente instalado em quatro prateleiras. Dada a sua fragilidade proveta, a minha coleção do Thesouro da Juventude foi a mais prejudicada. Mas teve outras preciosidades atingidas. Um livro bilíngüe de poesia universal e uma coletânea de poetas franceses contemporâneos, dentre outros, também foram atingidos. Definitivamente, uma tragédia.

Mas essas pequenas hecatombes domésticas sempre têm o seu lado bom. Depois de cavucar na internet, descobri que colocar pequenos recipientes com algodão embebido em terebentina serve para matar os fungos do mofo. Pequenos potes com cal virgem também ajudam a absorver a umidade. Não custa nada tentar.

O melhor de toda essa história é que me vi obrigado a por uma ordem nos meus livros. A partir disso, a trabalheira se transformou em prazer. Ter nas mãos cada um desses velhos e novos companheiros de viagem me leva a reviver os momentos em que cada um deles entrou na minha vida. Comecei hoje, e não sei quando vou terminar. Pois isso não é trabalho que se faça de enfiada, com o piloto automático ligado. É coisa a ser feita com cuidado, pegando cada livro com carinho, abrindo alguns deles numa página marcada com um pedaço de papel e ficar lendo algum trecho sublinhado, tentando adivinhar o que se estava pensando ou escrevendo quando se fez o tal destaque.

Depois, procura-se as melhores companhias para cada volume. Coisa difícil, pois alguns são inclassificáveis, sugerindo dois ou mais lugares nas estantes. Outros, de tão importantes em nossa vida, merecem um pedestal ou uma prateleira inteira para cada um deles. E tem o proletariado dos livros didáticos, além dos exilados para as prateleiras superiores pelo simples pecado de não fazer parte dos nossos interesses atuais. Mas cada um com o seu quinhão de história para lembrar.

Arrumar os livros é uma tarefa exaustiva, tanto do ponto de vista físico quanto do emocional. Na minha idade, já não é tão fácil subir e descer escada com alguns livros na mão. Também é difícil conter a emoção que me desperta cada um desses companheiros deste já não muito curta existência.            

Um comentário:

Juliêta Barbosa disse...

Ah, Ronaldo, como eu gostaria de estar no seu lugar! Passear pelos sublinhados dos nossos livros é lembrar um pouco de nós que esquecemos... Obrigada, por partilhar as suas emoções. Elas sempre me levam
a algum lugar de mim e, isso, me faz um bem enorme. Bjs