À sombra do soneto e outros poemas
O poeta é aquele que se debruça nas bordas do seu próprio abismo e dali contempla o que não é e poderia ter sido. O poeta é um saudoso de si mesmo. Por isso, todo poeta é triste.
Hildeberto é poeta. Logo, é triste. Sofre dessa saudade de si mesmo a que se convencionou chamar melancolia. E o seu novo livro, À sombra do soneto e outros poemas é o seu testamento melancólico.
O teor melancólico começa pela própria escolha da forma da maioria dos poemas que compõem a obra. Como se vivesse ofuscado pelo excesso de luz com que o contemporâneo fere seus olhos, o poeta refugia-se na sombra geométrica dos sonetos, contrapondo aos excessos sonoros das ruas este pequeno som (soneto) para vasculhar as sombras do seu abismo.
E lá, no fundo do poço, passeiam as imagens irrecuperáveis do seu relicário poético. As coisas do amor, da terra de nascença, da infância vivida nas léguas de sol e cinza e as lições definitivas das pedras. Um cata-vento, um juazeiro, um vaqueiro, um boi e um canário vivem ali. E ali morre uma mãe. Tudo o que o poeta perdeu e ainda permanece.
Vencido o ciclo asfixiante dos sonetos, o poeta nos dá Outros poemas, em que disfarça mal o fumo melancólico do seu poço. Lá está um arroubo perdoável, uma loa à flama ardente que consome o seu coração rubro-negro. Mas logo volta o tema recorrente: “sempre amei as pedras”. Desde as pedras de sua trágica Aroeiras à pedra preciosa da poesia. E o poeta avisa a quem lima o diamante das palavras “que a poesia/é sagrada matéria/coroada de luz/ e abismo”. Lembra ainda “que em cada artéria/de sílaba e silêncio/pulsa o coração/de Deus/ e sangra o coração/do homem.”
Convido o leitor a se debruçar sobre o abismo do livro de Hildeberto Barbosa. Tenho certeza de que cada um de nós nele encontrará suas próprias sombras. E pagará o preço do encontro com a moeda da sua própria melancolia.
Um comentário:
Ah, que belo convite! Espero ter oportunidade de ler o livro.
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