05 maio 2010

Os poetas da lua


Toda criança nasce poeta. Para os seus olhos, tudo é espanto, novidade. Sua leitura do mundo ainda não foi domada pela sintaxe careta da linguagem usada como moeda de troca. As circunstâncias é que podem embotar esse modo novo de ver o mundo.

Felizmente, minha neta ainda não foi treinada a pensar que não se pode pegar a lua com as mãos e dar de presente à sua mãe. Mais felizmente ainda, ela não está sozinha neste modo de apreender o mundo. Algumas mães, minhas amigas, vieram me contar como o pensamente poético também habita a alma de seus filhos.

Teresa Madeira me conta que sua filha Raquel, “quando era pequenininha, na rede da varanda da casa do Bessa, fez uma canção pra Lua que dizia assim: ‘A lua é tão grande, tão barrigudinha, a lua só vive no colo da nuvem’.”

Vitória Lima diz que não esquece “ a noite em que passeava numa praça de Maceió com meu filho e ele, se dando conta da lua nova, gritou surpreso: ‘Olha mãe, a lua rasgada no céu!’ As crianças são poetas naturais que elaboram metáforas e metonímias sem terem consciência desses processos complicados dos poetas. Para eles, tudo é poesia”, arremata Vitória, que também é poeta.


Valéria Tarelho me manda um conto escrito em 2003, após seus filho Álvaro “se espantar com a lua faltando um pedaço e falar que ‘tudo bem, quando o vovô chegar ele pega a cola e conserta’."

Cada um de nós carrega ainda esse antigo poeta que fomos um dia. É preciso apenas saber despertá-lo. E um bom começo é, de vez em quando, se despojar da sintaxe careta da linguagem e deixar que o mundo nos mostre novas conexões entre as coisas. A melhor forma de deixar isto acontecer é voltar a olhar para o céu nas noites de lua. Crescente, cheia ou minguante, a lua sempre encontrará um meio de nos causar espanto. Esse espanto, acredite, é pura poesia.


Ilustração: Veruschka Guerra




Um comentário:

Juliêta Barbosa disse...

Ronaldo,

Hoje, você prolongou o meu sorriso. Obrigada!