Não gostava daquela pessoa que o olhava no espelho. Custava crer que fosse ele essa pessoa. Pessoa, persona, máscara. É isto que olha para ele. Uma máscara. Simulacro de si, que se diz ser ele. Um faz de conta que os outros cumprimentam pelas ruas, simulam respeito e esperam ver pelas costas para fazer mesuras, estirar a língua, acenar gestos obscenos.
Não gostava do que via, mas ao mesmo tempo temia o que poderia existir além daquela máscara. Que anjo, que monstro, que bicho espreitaria por trás daquele rosto inexpressivo e pálido?
Se arrancasse agora esta máscara, tinha certeza que os olhos restariam os mesmos. Pois eles eram estranhos ao resto do seu rosto. Seus olhos o olhavam com a estranheza de quem está no rosto errado. Eram esses olhos que davam a certeza de que aquela cara não era a sua.
Não suportava mais olhar o rosto que o olhava do espelho. Queria ver-se a si próprio. Para além da máscara. Para o detrás daquela aparência atônita e perplexa. Queria ver o verdadeiro contorno dos seus olhos. Era por amor a seus olhos que estava pronto a se desmascarar.
Pegou uma lâmina afiada e traçou uma linha funda no contorno do rosto. Enfiou os dedos por dentro da pele da testa e puxou com toda força. Sentiu sem horror a pele se despregar do seu rosto até ter toda a máscara pendente de uma das mãos.
E antes que seus olhos se cobrissem do sangue que borbulhava da testa, pôde ver a outra máscara que insinuava uma verdade ainda mais atrás.
Clube do Conto, 16 de fevereiro de 2008.
Ilustração obtida em: tantodemim.blogs.sapo.pt/arquivo/z-mascara.jpg
3 comentários:
Prezado Ronaldo
Sempre a máscara a nos incomodar. É ela o motivo de fuga para todas as realidades nuas e cruas da vida.
Parabéns pela forma original da abordagem do tema. Muitos escritores da nossa fagueira Paraíba nada deixam a dever aos renomados escribas do sudeste "maravilha".
Fraternalmente,
Gilberto de Sousa Lucena
Parabéns! Seu estilo de escrever é fantástico. A mágica de transmitir o pensamento através da magia das palavras. Belo o seu texto, onde tirar a máscara é uma grande dor que machuca, rasga e marca.
Li outros textos, e achei-os fantásticos.
Um forte abraço,
Celina Stela
Interior do Estado de São Paulo
Parabéns! Seu estilo de escrever é fantástico. A mágica de transmitir o pensamento através da magia das palavras. Belo o seu texto, onde tirar a máscara é uma grande dor que machuca, rasga e marca.
Li outros textos, e achei-os fantásticos.
Um forte abraço,
Celina Stela
Interior do Estado de São Paulo
Postar um comentário