19 setembro 2012

Pessoas e bichos



 Entremos com cuidado no terreno desta crônica, porque é tênue a linha que nos separa da maldade e da galhofa. Quero tratar, hoje, da morte de um animal de estimação, assunto que invadiu os meios de comunicação há poucos dias. Pisemos levemente para não machucar os sentimentos de pessoas simples e amorosas que viram sua dor ser transformada em um espetáculo grotesco pelas redes sociais e pela grande mídia.

Todo mundo sabe o que aconteceu: Na cidade de Patos, na Paraíba, Genecira criava uma galinha há cinco anos. Rafinha, a galinha, era bem tratada, como todo animal de estimação: ia ao veterinário, tomava banho com sabonete de coco, dormia em berço com ventilador. Um dia, Rafinha desapareceu, para desespero de Gecenira e sua família. Uma semana depois, a polícia prendeu um suspeito que confessou ter trocado a galinha por duas pedras de crack.
A partir daí, segue-se uma série de acontecimentos que amplificaram a dor de Genecira, transformando-a em um espetáculo grotesco servido em grandes porções pelos meios de comunicação.
Foi o oportunismo de um humorista local, o Tatu, que o levou a divulgar no Youtube uma música ridicularizando a perda de Genecira. Não satisfeito, Tatu pediu a permissão dela para fazer o enterro simbólico de Rafinha. Mais de mil pessoas compareceram ao velório. Muitas delas foram prestar uma solidariedade sincera à família. Outras, foram apenas em busca de diversão. Até o prefeito da cidade passou por lá em busca de votos. Sucesso nas redes sociais, o enterro atraiu a grande mídia, com direito a cobertura pela equipe do Pânico, programa da Rede Bandeirantes. Quem viu as fotos ou assistiu aos videos pode constatar: em meio a toda a balbúrdia, a expressão da família de Genecira é de dor e sofrimento. Mas isto não interessava a ninguém.
Fechemos com cuidado esta crônica. Vamos deixar em paz a família de Genecira para fazer o luto de sua perda. Pois esta é a única coisa que ela quis fazer. Chorar sua dor pelo desaparecimento de um ente querido que foi trocado por duas pedras de crack. É aqui que reside toda a miséria e brutalidade que escapou do estardalhaço da grande mídia.  
    
Ilustração obtida em http://www.desenhosdecolorir.com.br

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