Não sei o que têm os peixes para atrair mentirosos em sua volta. Pois não são apenas os pescadores que mentem. Todo mundo sabe que os vendedores de peixe também são hábeis mentirosos. Se quiser fazer um teste, chegue junto de um peixe de olhos baços, guelra marrom e a carne afundando ao mais leve toque dos dedos. Pergunte, então, ao vendedor se o peixe é fresco.
Tem também as enganações a respeito dos tipos e espécies. Um vendedor já me disse que qualquer coisa vermelha, até mesmo um batom, eles vendem como cioba.
Um dia, eu estava no mercado do peixe de Tambaú, aquele de antigamente, com o cheiro de podre estendendo-se por quilômetros de distância. Tinha comprado umas postas de beijupirá e fiquei por ali, conversando mole com os peixeiros. Logo chegou uma madame que perguntou se tinha arabaiana, pois ela só comia arabaiana. Na maior cara de pau, o vendedor cortou as postas de arabaiana do mesmo beijupirá que me tinha vendido. A madame saiu satisfeita, pagando quase mais da metade do que eu havia pago pelo mesmo peixe. Depois disso, dá para acreditar em conversa de peixeiro?
Toda essa conversa é para contar o que aconteceu quando fui, no sábado pela manhã, comprar o peixe que ilustra esta crônica. O vendedor me disse que era uma arabaiana. Quando eu contestei, dizendo que arabaiana é castanha, apressou-se em dizer que aquela era uma arabaiana preta, muito conhecida por quem entende de peixe. Ante a minha expressão desconfiada, perguntou ofendido se eu o estava chamando de mentiroso. Claro que eu disse que não, pois, arabaiana ou não, eu tinha simpatizado com a cara do peixe.
Domingo de noite, aproveitando a casa vazia de filhos e netas, botamos a suposta arabaiana no forno para depois consumi-la acompanhada por um honesto vinho verde. Pouco importava se o vendedor havia mentido ou não. O peixe estava uma delícia.
Depois de fome e sede saciadas, dediquei um enorme perdão a todos os que mentem em torno dos peixes. Sei que não devia confessar, mas até eu, para não perder a fama de grande conhecedor de peixes, de vez em quando minto quando não sei o nome do peixe que comprei.
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