01 agosto 2010

Só mais um pouco





Não vamos desistir ainda. Por mais tenebrosas que sejam as notícias sobre os nossos semelhantes, vamos agüentar mais um pouco. Mesmo que um delegado de polícia diga na televisão que o ser humano está ficando cada vez pior. E ele entende do assunto, vive o dia-a-dia da violência e do desamparo.
Se me perguntarem o porquê desta recaída de esperança, eu não vou saber responder. No fundo, é mais um desejo de que já tenhamos tocado no fundo do poço e agora só nos caiba voltar à tona da onde nos espera a luz da racionalidade.
É urgente que tomemos o caminho da razão. Pois somente ele poderá nos levar à construção da solidariedade. Por uma questão muito simples: a solidariedade não é um atributo natural do ser humano. Ela precisa ser construída a partir do instrumento da racionalidade.
Diferente dos outros animais, o ser humano abandonou o cuidado com a preservação da sua espécie, prendendo-se narcisicamente aos laços com os que lhe são imediatamente iguais: a família, o território, a cor da pele, a etnia, a classe social. O que não lhe for semelhante, torna-se um estrangeiro, um outro a ser afastado ou destruído.
Narcisismo é o nome da doença do homem contemporâneo. É impressionante o esforço que se faz para não sair deste círculo ilusório de conforto e segurança. Tudo o que nos forçar abandonar este lugar será visto como ameaçador. Deve, portanto, ser destruído. Qualquer coisa que reforce a nossa permanência neste cubículo fechado de nós mesmos será recebida com prazer. Daí as drogas, daí as gangues, daí as torcidas organizadas prontas para matar o portador da camisa do time adversário.
Sei que as notícias, vindas da mídia ou das conversas na cozinha, tendem a reforçar cada vez mais a nossa descrença no ser humano. Mas vamos agüentar mais um pouco. Só mais um pouco. Aqui e ali surgem notícias de grupos de pessoas trabalhando contra a corrente narcísica. Tem gente preocupada com o destino do planeta, com o destino das pessoas. Vamos acreditar só mais um pouco que a humanidade é um processo de construção coletiva. E que ainda há tempo para ajudarmos nesta construção.

Imagem: José Luiz Landeira. Obtida em Blog Em Dia Com a Cidadania.

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