Eles andam sem rumo, atolados na lama. Perambulam em volta e em meio ao nada. O nada em que se transformou tudo o que tinham de seu. Suas tralhas, suas casas, suas ruas, seu lugar. Alguns perderam seus filhos, seus parentes, seus bichos. Tudo em volta é perda. Uma perda úmida, lamacenta, fétida.
Treme a voz calejada de militares que viveram a miséria do Haiti. Lá, a terra tremeu. Aqui, a terra sangrou. Um sangue estranho, de cor barrenta, transbordou das veias dos rios espalhando o horror da hemorragia.
Santana do Mundaú, Muquém, Cortês, Branquinha. Nomes que antes lembravam lugares de origem de muitas vidas, transformaram-se em pontos de uma geografia pastosa e mortífera. Em Pernambuco e Alagoas, pelo menos 46 pessoas morreram. Isto sem contar os desaparecidos, cerca de 540, habitantes do limbo e da esperança.
São mais de cem mil desabrigados. Mais de cem mil ambulantes vagando entre o nada e a coisa nenhuma. Proibidos de ver o lugar, os viventes e as coisas que lhes pertenciam, os olhos retiram-se vasculhando o nada. Impedidos de pisar com segurança o chão firme em que habitavam, os pés marcham para lugar nenhum. Sem ter para onde ir nem onde ficar, as pessoas entram em suspensão. O olhar ausente denuncia a fuga do espírito daquele corpo sem rumo.
As caras são de desespero, de derrota frente à fatalidade, nem tanto imprevisível assim. Se prestarmos atenção às falas, às roupas e ao que restou nos entulhos encharcados, veremos que, em sua grande maioria, estes são os eternos flagelados de qualquer parte do mundo. Pobres, é o que eles são. Moravam nas beiradas dos rios, por não ter lugar mais seguro onde morar. É assim, na maioria dos desastres “naturais”. Cheias, secas, terremotos, maremotos, qualquer que seja o flagelo, são sempre eles, os pobres, que vemos perambular sobre os vastos campos do nada.
Um comentário:
como é pesada a miséria do mundo.
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