Antigamente (e bota antigamente
nisto), os mais velhos costumavam usar alguns ditados para incutir certos
princípios na cabeça das crianças. Lá em casa, minha mãe vivia repetindo: “boa
romaria faz quem na sua casa está em paz”. O que significava: é melhor ficar em
casa do que arranjar confusão na rua. Outro ditado que ouvi muito foi: “quando
a cabeça não pensa, o corpo é que padece”.
Se eu tivesse sido um menino
obediente, não estaria agora com o corpo padecendo a falta de juízo que me levou,
junto com minha mulher, a fazer uma romaria quase mortal à cidade de São Paulo.
Claro que eu não ia perder o
lançamento do meu novo livro na Bienal. Muito menos deixar de ver a exposição
dos impressionistas no Centro Cultural Banco do Brasil, nem a exposição de
Caravaggio no MASP. Tudo isto em míseros três dias.
Minha mulher costuma dizer que,
desdenhando dos nossos 65 anos, saímos de casa pensando que temos 45, para
voltar arrastando o peso dos 80. Não foi diferente nesta última viagem. No
primeiro dia, passamos a manhã fazendo o reconhecimento do terreno da Bienal,
marcando o território das editoras que valiam a pena ser visitadas. Daí, fomos
para a Sé, onde fica a o CCBB. Depois de uma hora e meia de fila, passamos mais
duas horas impressionados com os impressionistas. Nada mais natural que
voltássemos para o hotel, já mortos de cansaço. Mas isto é coisa para os
fracos. Tínhamos o lançamento do livro de poemas de André
Ricardo , numa mercearia descolada em Vila Madalena.
Resultado: chegamos ao hotel já passando das dez da noite.
No segundo dia, passamos a manhã
comprando na Bienal. Um mínimo de juízo nos levou de volta para o hotel, de
onde saímos às quatro da tarde para o MASP. Para facilitar, pegamos uma saída de metrô que não tinha escada rolante. Chegamos no topo da Avenida Paulista com o
coração na boca. Mas Caravaggio e seus seguidores nos esperavam para
reconfortar nossos espíritos. Não tinham nada a ver com as dores dos nossos
corpos. Mas ainda faltava comprar alguns livros que nos encomendaram. Era só atravessar
a avenida e dar um pulinho ali na Livraria Cultura, no Conjunto Nacional. Não
sei muito bem o que aconteceu, mas tive a clara sensação de que aumentaram a
distância entre o museu e a livraria.
O terceiro dia foi mais maneiro.
Cheguei na Bienal às duas da tarde, esperando o meu lançamento que seria às
seis. Consegui administrar a canseira até chegar à casa de um casal
amigo que nos reconfortou com pão e vinho.
Como ainda dizia outro ditado dos
mais velhos: “quem não ouve conselhos, raras vezes acerta”. Por muito pouco não
nos transformamos nos mais novos mártires da cultura.
Imagem obtida em: www.willarte.com.br
Um comentário:
Parabéns pelo livro. Meus pêsames pelo resto.
O título não está bom. Não foram mártires da cultura - mas de uma cultura específica, o consumo que hoje a envolve e esmaga.
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