Conheço um
homem que se angustia com os relógios em que o ponteiro dos segundos desliza
sem marcar os intervalos. Um comichão interpretativo me leva a supor que essa
angústia decorre do nosso desamparo frente à transformação contínua do presente
em passado, sem nos deixar a ilusão de que, por um breve momento, o tempo
repousa nos traços dos segundos.
É para fugir
da agonia frente a este fluxo constante que dividimos o tempo em fatias e vamos
fingindo que o devoramos, enquanto, na realidade, é ele que nos consome goela
abaixo.
E assim
inventamos as horas, os dias, anos, séculos e milênios na tentativa de nos
defendermos da pequenez da nossa existência. Com isto podemos nos enfronhar no
passado e projetar no futuro, fugindo dos limites da mediocridade do presente.
É isto que nos leva a procurar ancestrais ilustres em nossas árvores
genealógicas e imaginar uma vida gloriosa para nossos descendentes. É uma forma
plausível de nos tornarmos eternos.
Aqui estamos,
de novo, brincando de eternidade. Diz o calendário que mais uma vez iniciamos
um ano novo. Mesmo sabendo que isto é apenas uma convenção, necessitamos deste
repouso do tempo em que algo passa definitivamente e algo desconhecido avança
ao nosso encontro. É neste intervalo que nos juntamos aos nossos antepassados e
caminhamos rumo às gerações descendentes. Como o homem que se angustia com o
correr contínuo do ponteiro dos segundos, precisamos fatiar o tempo para criar
a ilusão da eternidade. E com isso inventar alguns momentos de felicidade.
2 comentários:
Bela imagem, Doc. Curioso, ao contrário do que ouço tanto, acho que vivi uma eternidade.
Grandes horas pra você, mestre, em 2014.
W. J. Solha
uma brincadeira gostosa que nunca cansamos de repetir, né Rona?
feliz ano novo, meu querido.
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