Olhar estrelas. O que pode haver de novidade em um
hábito tão antigo quanto a existência da espécie humana sobre a terra? Eu vos
direi, no entanto, que esta noite eu vi as estrelas de um modo tão novo, que
nem me lembro quando as vi assim pela última vez.
Deixem-me explicar. Desde os onze anos carregava
comigo uma miopia que incorporou os óculos de forma irrevogável ao meu rosto.
Com o passar do tempo, a esta miopia veio se incorporar um processo de formação
de catarata que aos poucos foi me esmaecendo a visão. Acontece que decidi
operar as tais cataratas, e, junto com elas, corrigir a minha boa e velha
miopia.
Só quem passou por um processo semelhante sabe o
espanto que causa a recuperação da visão nítida das coisas. Passei a ver o
mundo em HD. Mas o que mais me impressionou foi notar que as coisas ganharam um
brilho diferente. A luz do sol ficou mais clara e reluzente. Até as lâmpadas
perderam o tom amofinado e se tornaram brancas as que eram brancas e amarelo brilhante
as que eram apenas amarelas.
Mass o melhor de tudo aconteceu agora de noite.
Apaguei todas as luzes do terraço e do jardim e olhei para o céu. Lá estavam
elas, as estrelas, nítidas, claras, com o brilho azulado que há muito eu não
via. Lá estavam as Três Marias, mais para o lado o Cruzeiro do Sul, mais a
baixo o avermelhado Marte...
Ora, direis, que besteira, olhar estrelas. Bilac ao
menos as ouvia. Mas o jovem Olavo era vesgo. Talvez a sua vaidade não permitisse
que olhasse o céu, para não expor sua assimetria às donzelas na calçada da
Colombo. Hoje eu vi as estrelas e elas piscaram para mim. E só não foram além
desse gesto cúmplice para que vocês não pensem que eu perdi o senso.
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