Faz tempo que os dois estão no
quarto comigo. Se eu perder o sono, como bons amigos, eles são capazes de
passar a noite acordados comigo, me dando prazer, mexendo com minha imaginação.
Um se chama “onde a minha rolleiflex?”, o outro, “A idade das chuvas”. Dois
maravilhosos livros de poemas. O
primeiro foi escrito por Márcia Maia e o segundo por André Ricardo Aguiar.
O de Márcia Maia chegou primeiro. Ganhei na
mesma noite em que foi lançado como vencedor dos Prêmios Literários Cidade do
Recife. Noite boa, rodeada de amigos, no salão de festas do velho teatro do Brum,
na parte antiga da cidade.
O de André Aguiar, fui buscar
mais longe, num bar superdescolado em Vila Mariana, São Paulo. Noite boa,
rodeada de gente que nunca tinha visto, mas que eram meus íntimos. A melhor
qualidade de um bar é a de tornar amigos de infância gente que nunca se viu na
vida.
Mais do que dois livros, são dois
cúmplices que dormitam em minha cabeceira. A qualquer sinal de insônia, eles
também se acordam e me perguntam se quero conversar. Quero sim. E o primeiro me
diz: “por detrás do temporal/o céu tremula”. E se aquieta meu coração que se
acordou aos pulos com o sonho ruim. E o outro arremata: “Nada pesa/mais que o
coração”. E o meu coração pesado mais se aquieta.
Sei que alguns leitores zangados
vão dizer que poemas não são feitos para aquietar o coração de ninguém. Até
concordo com eles. Mas é preciso que o poema primeiro dite o tom que precisa
para entrar em sintonia com o leitor. Depois, matreiro, enche você de
inquietação.
E o que mais me inquieta em
Márcia Maia são os ritmos insólitos que consegue extrair dos seus poemas. É uma
técnica só dela, que nos impõe a cadência exata que emoldura o sentido das
palavras.
Já em André, inquieta o insólito
das imagens, a mudança brusca do sentido em direção oposta ao lugar comum que o
leitor viciado ocupa.
Por mais um bom tempo esses
amigos velarão á minha cabeceira. Até que se cansem das minhas insônias e
queiram se mudar para uma prateleira cômoda, onde possam dormir sossegados.
2 comentários:
tão bom e bonito de ler que até deu vontade de não ter um sono tão relaxado e conseguir esta boa companhia.
Gosto de André Gide e Alphonsus de Guimaraens. Sempre encontro algo novo.
Beijos!!!!
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