Entremos com cuidado no terreno desta crônica, porque é tênue a linha que nos separa da maldade e da galhofa. Quero tratar, hoje, da morte de um animal de estimação, assunto que invadiu os meios de comunicação há poucos dias. Pisemos levemente para não machucar os sentimentos de pessoas simples e amorosas que viram sua dor ser transformada em um espetáculo grotesco pelas redes sociais e pela grande mídia.
Todo mundo sabe o que aconteceu: Na cidade de Patos, na Paraíba, Genecira criava uma galinha há cinco anos. Rafinha, a galinha, era bem
tratada, como todo animal de estimação: ia ao veterinário, tomava banho com
sabonete de coco, dormia em berço com ventilador. Um dia, Rafinha desapareceu,
para desespero de Gecenira e sua família. Uma semana depois, a polícia prendeu
um suspeito que confessou ter trocado a galinha por duas pedras de crack.
A partir daí, segue-se uma série
de acontecimentos que amplificaram a dor de Genecira, transformando-a em um
espetáculo grotesco servido em grandes porções pelos meios de comunicação.
Foi o oportunismo de um humorista
local, o Tatu, que o levou a divulgar no Youtube uma música ridicularizando a
perda de Genecira. Não satisfeito, Tatu pediu a permissão dela para fazer o
enterro simbólico de Rafinha. Mais de mil pessoas compareceram ao velório. Muitas
delas foram prestar uma solidariedade sincera à família. Outras, foram apenas
em busca de diversão. Até o prefeito da cidade passou por lá em busca de votos.
Sucesso nas redes sociais, o enterro atraiu a grande mídia, com direito a
cobertura pela equipe do Pânico, programa da Rede Bandeirantes. Quem viu as fotos ou assistiu aos videos pode constatar: em meio a toda a balbúrdia, a expressão da família de Genecira é de dor e sofrimento. Mas isto não interessava a ninguém.
Fechemos com cuidado esta
crônica. Vamos deixar em paz a família de Genecira para fazer o luto de sua
perda. Pois esta é a única coisa que ela quis fazer. Chorar sua dor pelo
desaparecimento de um ente querido que foi trocado por duas pedras de crack. É
aqui que reside toda a miséria e brutalidade que escapou do estardalhaço da
grande mídia.
Ilustração obtida em http://www.desenhosdecolorir.com.br
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